Hoje sem quer navegando pela net encontrei esse texto escrito por Alexandro Gesner, ao qual comenta a repeito da profissão ao qual sigo, e não teria como colocar em outras palavras o que li.
Penso que QUERER é algo muito forte. Para se querer alguma coisa de verdade, é preciso conhecê-la, avaliar os pontos positivos e negativos e concluir: Eu quero! Do contrário, não é “querer”, é uma mera vontade. Vontade fraca, que dá e passa. Por isso que não acredito que muitos queiram ser enfermeiros, apenas têm vontade.
"Num grupo facebook aberto pelo Enfermeiro Carlos Eduardo, deparei-me com esta interrogação indignado. O impulso de responder imediatamente foi interrompido por outros afazeres, o que me possibilitou analisar a coisa de forma mais aprofundada. Por isso, ao invés de afirmar uma série de coisas como faria, inicialmente coloco uma outra pergunta:
E quer?
Penso que QUERER é algo muito forte. Para se querer alguma coisa de verdade, é preciso conhecê-la, avaliar os pontos positivos e negativos e concluir: Eu quero! Do contrário, não é “querer”, é uma mera vontade. Vontade fraca, que dá e passa. Por isso que não acredito que muitos queiram ser enfermeiros, apenas têm vontade.Primeiro, porque nós, enfermeiros, pecamos muito quando o assunto é marketing profissional. Não sabemos fazer propaganda da profissão. Quando enfermeiras ou enfermeiros falam da Enfermagem, são bipolares: ou a fantasiam como algo divino, quase mágico, que sabem não existir (mas acham bonitinho falar), ou pintam como a pior desgraça dos universos, o inferno de Satanás elevado à vigésima potência, algo tão ruim que o ouvinte se pergunta: “E como consegue ainda estar na Enfermagem?”. É muito raro ouvir/ler algo que realmente pondere a situação da profissão de forma objetiva e inteligível. Sem saber exatamente o que faz um enfermeiro, fica difícil querer ser um.
Além disso, há o segundo problema: sem acompanhar o cotidiano de um enfermeiro para descobrir por si mesmo como é o trabalho dele, o aspirante apenas idealiza, com o mínimo de razão, o que seria um enfermeiro, de forma superficial e estereotipada: é o “chefe” da equipe de enfermagem, que manda nos auxiliares e técnicos, veste branco, vive de pose, só escreve e manda fazer, cansa-se pouco porque não “pega no pesado” e, principalmente, ganha rios de dinheiro. O que me surpreende dentro deste folclore todo? Sobressaem-se nos discursos o “só faz mandar” e o “ganha bem”.
Quando eu associo esses dois pontos, afirmo com toda convicção que não é possível querer ser enfermeiro pensando nisso. Em verdade, essa pessoa quer FACILIDADES e acha que ser enfermeiro atende a este critério. Por isso, não quer ser enfermeiro: apenas tem vontade de ser enfermeiro porque acredita que isso é sinônimo de facilidade.
Aviso aos navegantes: ser enfermeiro não é nada fácil. Fácil é fazer um curso de enfermagem em uma faculdade qualquer que entrega um diploma a muitos que sequer passaram por uma vivência prática nos estágios. Esses que, com um diploma na mão, não conseguem aprovação nas seleções existentes e ficam por aí, desempregados, pedindo a um ou outro político uma oportunidade para trabalhar. Fácil é ter um diploma de enfermeiro, diante da péssima qualidade de muitas escolas de enfermagem existentes, da morosidade do MEC em fechar os cursos ruins e da facilidade do mesmo Ministério em autorizar a abertura de novos cursos.
Difícil é coordenar uma equipe multiprofissional com competência (mediando os conflitos interpessoais que surgem o tempo todo), saber tratar um paciente com dignidade e respeito até nos últimos segundos de sua vida e manter a provisão de insumos e equipamentos de uma unidade de saúde ou clínica, simultaneamente.
Difícil é respirar fundo e se despir de todos os preconceitos pessoais para atender a prostituta, o travesti, o bandido sem transferir a eles qualquer sentimento que não seja necessário para o exercício do “cuidar de uma vida”.
Difícil é ter que interromper o plantão para tomar banho por estar encharcado de sangue, fezes ou vômito após um procedimento eletivo ou atendimento de emergência. Difícil é ter que gerenciar o espaço para dez pacientes numa clínica com cinco leitos, fazendo malabarismos e comprando briga para manter o funcionamento do setor minimamente sustentável, e ainda escutar as reclamações dos familiares como se a governabilidade sobre a macropolítica do sistema de saúde fosse exclusivamente sua.
Difícil é sair da redoma dos consultórios e enfrentar a vida das pessoas como ela é, visitando seus lares (ou meras moradias), descobrindo que não está pisando em lama, mas em fezes porque naquela periferia não há esgotamento sanitário. É se envolver com problemáticas sociais que estão muito além do processo “doença-tratamento/cura”, mas que condicionam de maneira ímpar o processo “qualidade de vida”.
Difícil é remar contra a maré num sistema que historicamente valorizou apenas uma categoria da equipe multiprofissional e que tenta, de todas as formas, manter esse desenho mesmo diante do colapso flagrante que se vê após a mercantilização daquela categoria.
Difícil é ter que conjugar cargas horárias de serviços pesadíssimas para dar conta dos compromissos financeiros, dos livros e dos cursos de pós graduação que se tornaram indispensáveis, e lembrar que todo o trabalho feito deveria ser melhor remunerado.
Ser Enfermeiro é ser capaz de enfrentar todas essas dificuldades (e outras que não pude abordar por falta de espaço) e de se manter no grupo. Não por sermos masoquistas, mas por sermos viciados em desafios, por entendermos que o cuidado humano é indispensável e por acreditarmos que as engrenagens movidas por nós de forma quase invisível mantêm muito daquilo que chamamos sistema de saúde, seja público ou particular.
Somos Enfermeiros porque conseguimos vislumbrar que a busca pela melhoria da qualidade de vida de nossas comunidades é algo superior, que suplanta as dificuldades do nosso cotidiano.
Enfermeiros formam uma corrente semelhante à energia elétrica: estamos presentes nas vidas de todos, mas apenas os frutos do nosso trabalho são visíveis. Na maioria das vezes, apenas a nossa ausência é percebida.
Portanto, se você gosta de pose e quer confetes, afaste-se da Enfermagem. O Brasil não precisa de mais enfermeiros. Precisa apenas de enfermeiros com competência técnica, responsabilidade ética e compromisso social. A Enfermagem Brasileira precisa de pessoas que queiram enfrentamentos, desafios, que não se acomodem e que não desistam diante de sucessivas negativas.
Por isso, precisamos de pessoas honestas, que trabalhem com vontade, que gostem de pessoas, de ciência e de qualidade. Querer vestir branco não é o suficiente."
Alexandro Gesner
“Vamos ao trabalho!
E só há uma maneira de fazê-lo
Direito, bem feito,
Senão é melhor nem começar.”
E só há uma maneira de fazê-lo
Direito, bem feito,
Senão é melhor nem começar.”
Titãs




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